Filhos do deus Sol

Este é o Quinto Mundo. Os ancestrais da humanidade viviam no Quarto Mundo, abaixo deste, quando um dilúvio chegou, com ondas altas como as montanhas. Os ancestrais fizeram um buraco no céu, e escaparam para o mundo onde agora vivemos. Um dia as pessoas ouviram de longe o som "Wu'hu'hu'ú" de Hastyéyalti, o deus falante. Vagarosamente o ruído aumentou, até escutarem a marcha do seu mocassim, e finalmente ele apareceu. De um pedaço de turquesa ele fez Istsá Natlehi, a Mulher que Muda. De duas espigas ele fez Menino do Milho Branco e a Menina do Milho Amarelo.
Mulher que Muda vivia sozinha num hogan numa ilha a oeste, é de lá que sopra a brisa da primavera e as chuvas chegam para regar a terra dos Navajo. Sentindo-se solitária, um dia saiu andando, sentou-se ao sol e adormeceu. Quando acordou teve a sensação de que alguém tinha estado com ela. Depois de dois dias deu à luz a um menino. Cavou um buraco ao lado do fogo e escondeu-o ali. Depois sentiu vontade de se lavar e então colocou-se embaixo de uma saliência de rocha da qual caía água. Dois dias depois deu de novo à luz outro menino. Ela os criou e protegeu dos gigantes e monstros que queriam lhe fazer mal. Cresceram extraordinariamente depressa e tornaram-se dois jovens sadios e bonitos. Um dia partiram em busca de encontrar o pai e pedir sua ajuda para derrotarem os espíritos malignos que atormentavam a humanidade.
Na viagem, tiveram de superar muitos obstáculos difíceis. O primeiro, Menino Duna de Areia, que os alcançou e puxou para dentro da areia. Equilibraram-se em calhas para água e rezaram para o monstro. Como nunca tinha sido tratado daquela maneira, ele os deixou passar.
Depois chegaram onde estava uma mulher que carregava um fardo. Ela era Mulher Velhice. Ficou surpresa quando os viu, pois as pessoas da terra nunca tinham vindo até ali, e aconselhou-os a não seguir pelo mesmo caminho que ela. Eles ignoraram o que ela dissera, foram também por ali, e em breve estavam velhos e decrépitos. Ela voltou e sentiu pena deles, então cantou e esfregou seus corpos até que voltassem a ficar jovens e fortes outra vez.
A seguir encontraram Mulher Aranha uma velha de muita sabedoria, que viviam numa casinha enfiada no chão. Parecia muito pequena, mas conseguiram entrar facilmente. Ela deu-lhes de comer um alimento que se reabastecia magicamente, e colocou-o num pedaço de turquesa para o mais velho e de concha branca para o mais novo. Depois de terem comido, ela lhes ofereceu uma pena de águia dizendo: "Seja que for que fizerem, não mostrem isso; escondam perto do coração. Isto os ajudará e protegerá quando estiverem em dificuldade. Não digam a Tsohanoai, seu Pai-Sol, que eu lhes dei isso pois roubei-o dele".
Depois deixaram Mulher Aranha, eles chegaram aos perigosos Juncos Cortantes, que primeiro prometeram deixá-los passar, mas depois começaram a cortá-los em pedaços. Destemidos, confiaram em suas penas e esgueiraram-se por entre os talos. Então, deslizaram por entre as Rochas Que Batem Palmas e por pouco evitaram o Povo Rabo de Gato que esfaqueia as pessoas até que elas morram. Com a ajuda de seu Conselheiro Espiritual, Pequeno Vento, de Homem Arco-Íris que podiam transportá-los por cima de qualquer obstáculos, e de suas penas, conseguiram passar a salvo.
Então, chegaram a uma massa de água tão grande que ia até o céu e unia-se a ele. Os gêmeos viram-se impotentes, mas confiaram em suas penas e deixaram-se ser transportados. Disseram: "Saberemos para onde estamos indo quando chegarmos lá".
Cruzaram a grande água e chegaram à casa do Sol, guardada por quatro ursos, quatro grandes serpentes, quatro grandes ventos e quatro grandes trovões. Lá encontraram a filha do Sol, que se chamava Menina Turquesa, e também Menina Concha Branca e Neta das Trevas. E ela os interroga e eles lhe dizem quem são. Ele sabia do perigo que os espreitava e tentou ocultá-los nas nuvens, enrolados acima da soleira da porta. Os dois continuavam com suas respectivas penas próximas ao coração. Sol chegou em casa de mau humor e queixou-se que vira estranhos entrando na casa. Puxou todas as nuvens para baixo até os encontrar.
O perigo era enorme. Sol não acreditava no que lhe diziam, e por isso estipulou provas dolorosas que os testassem. Primeiro, colocou-os na Sauna Sagrada com tanto calor que as pedras lá dentro começaram a rachar e voar para os lados. A filha do Sol ficou com pena deles e cavou buracos no chão. Quando a casa esquentou e as pedras voaram, eles ficaram a salvo no fundo dos buracos. Sol ficou atônito quando descobriu que não haviam sido feridos.
Em seguida, Sol tentou dar-lhes um mingau envenenado, mas foram advertidos por sua amiga lagarta e só comeram a parte que ela lhes disse que estava boa. Sol começou a acreditar que talvez fossem mesmos seus filhos.
A prova final era a pior de todas. Sol levou-os para um aposento onde haviam quatro vigas, preta, azul, amarela e branca, recobertas com afiadas facas de sílex. Pegou o mais velho dos rapazes e levou-o até o topo do poste preto e disse-lhe que deitasse olhando para baixo. Empurrou-o então para que caísse bem em cima das facas. O filho mais velho agarrou-se fortemente à sua pena, escapou por um triz das lâminas, e aterrissou a salvo sobre os próprios pés. Aconteceu o mesmo com o irmão menor. Sol, ainda não convencido, empurrou-os mais duas vezes, do alto de mais dois postes. Quando também conseguiram chegar são e salvos no chão. Ele enfim os reconheceu como filhos.
Agora Pai-Sol exibe seu lado magnânimo e oferece-lhes a escolha de todo seu rico território, contido nos quatro amplos aposentos abertos aos quatro pontos cardeais. Os gêmeos viram tudo, mas só pediram os remédios e as armas que precisavam para matar os espíritos malignos. Sol lamentou - os monstros também eram seus filhos - mas, embora relutante, concordou em ajudar. Suas filha moldou seus corpos com uma mágica especial, até ficarem fortes e belos, e chamou-os de seus irmãos. Sol deu-lhes uma armadura de sílex, preta para o mais velho e azul para o mais novo. Colocou uma imagem de um homem de 10 cm. de comprimento dentro de suas bocas e chamou-os por seus nomes guerreiros, Matador de Monstros e Filho da Água. Estavam agora prontos para descer e Sol levou-os até o buraco do céu, para submeter à prova seu conhecimento dos aspectos geográficos lá embaixo. Quando mostraram suas habilidades com a ajuda habitual de Pequeno Vento, ele disse: "Eu lhes darei minha sabedoria antes que desçam. Vocês devem usá-la sempre e apontá-la para baixo de modo que tudo que sei sempre esteja sobre a Terra". Sol deu a cada um uma pena diferente da que haviam recebido de Mulher Aranha, então desceram. Aterrissaram no Monte Taylor, ao amanhecer, envergaram suas armaduras. Sol deu-lhes suas armas, flechas e lanças de relâmpago, e estavam então prontos para combater.
Com essas armas e ajuda do Sol, os heróis mataram o Grande Monstro, símbolo dos apetites lascivos e indisciplinados do homem, e dessa forma abriram caminho para a nova cultura navajo.

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